Maternagem como um recurso para ressignificar a vida

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Luciene Santos de Souza Conceição
Email: luciene16@gmail.com

Especialista em Psicologia Biodinâmica pelo Instituto Biomater em parceria com o IBPB

A Psicologia Biodinâmica trouxe para psicólogos uma nova maneira de ver seus pacientes, o modo de cuidar e estar presente em seus atendimentos. Gerda com seus atendimentos e experiências apresenta uma abordagem que integra, de modo sistêmico, técnicas inovadoras de massagem, o toque como meio de comunicação não-verbal, a associação livre de ideias e de movimentos, exercícios mobilizadores e harmonizantes, além de diversas formas de elaboração simbólica a partir da fala, dos sonhos e da imaginação.
Gerda mostra a necessidade de um manejo suficientemente bom na prática clinica, por isso a Biodinâmica nos ajuda na compreensão do ser humano como um todo, pois ela utilizou-se de várias abordagens teóricas para a construção da Psicologia Biodinâmica, entre essas abordagens podemos citar uma base reichiana, psicodinâmica, elementos da neurociência, psicanalítica e winnicottiana entre outras, nesse trabalho será focado na visão winnicottiana a maternagem.
Em sua teoria Winnicott fala de uma mãe suficientemente boa que ao aplicarmos na Psicologia Biodinâmica temos na figura do terapeuta este ser suficientemente bom que acolhe e compreende os conflitos do seu paciente sem invadi-los.
Quando Winnicott fala sobre a Teoria do Amadurecimento Pessoal, temos o período da maternagem, ao qual é necessário todo o cuidado por parte da mãe, para um desenvolvimento saudável do bebê.
Diante da necessidade de um bom desenvolvimento nesta fase, tem sido visto muito em consultórios que há uma falha nesse período do desenvolvimento, podemos a partir da Psicologia Biodinâmica trabalhar a rematernagem e assim propiciar ao paciente uma ressignificação da sua vida.
Este trabalho visa mostrar uma das facetas da Psicologia Biodinâmica que contribuem com o resgate da criança interna através da rematernagem, podendo integrar a pessoa como um todo: bebê, criança, adolescente e adulto num processo de amadurecimento contínuo na vida.
MATERNAGEM

O dicionário Aurélio define maternagem como a técnica psicoterapêutica que visa estabelecer entre o terapeuta e o paciente uma relação semelhante a uma relação entre mãe e filho.
Podemos então entender a maternagem como a atenção dedicada aos cuidados para com o filho, ou seja, estar presente a partir do nascimento do bebê, pois este precisa estar em contato com sua mãe principalmente pelo toque, como por exemplo, na amamentação, no ninar.
Uma mãe pode vir a ter a maternidade que é a capacidade para gerar um filho, porém não são todas capazes de possuir a maternagem que é a capacidade de cuidar, ser afetuosa para com o bebê.
Podemos citar o que Winnicott fala como ser uma mãe suficientemente boa, que é a mãe que tem o manejo sutil para atender as necessidades de seu bebê, estar atenta e sempre presente para atendê-las e de outro lado temos a mãe burocrática, aquela que não conseguiu desenvolver seu lado emocional para ajudar a atender as necessidades de seu bebê, ela atende as necessidades de uma maneira automática, não dando a atenção de que seu bebê precisa neste momento do seu desenvolvimento.
Segundo Winter e Duvidovich (2004,38) para Winnicott maternagem é a forma de uma mãe cuidar de seu bebê de maneira boa, protetora. São os bons cuidados que incluem o amparo às necessidades fisiológicas e todo investimento de desejo, de amor, de aconchego. A mãe passa ao seu bebê os limites e proteção, gerando para ele possibilidades de sobrevivência frente ao novo ambiente que pode ser considerado hostil.
Temos a maternagem como o vinculo afetivo estabelecido pelo bebê pelo cuidado e acolhimento que sua mãe oferece, sabemos também que na atualidade essa função tem sido dividida para com as creches, babás ou pessoas próximas que tomam conta dessas crianças, porém sabemos também que independente de com quem seja estabelecido esse vinculo, ele precisa propiciar a criança toda a segurança necessária para seu bom desenvolvimento.
Para que o bebê se desenvolva com a ajuda de uma mãe suficientemente boa, esta precisa colocar em prática três funções que Winnicott chama de holding (sustentação); handling (manejo) e apresentação dos objetos.
O holding se caracteriza pela maneira como o bebê é sustentado no colo pela sua mãe e é, ao mesmo tempo, uma experiência física e uma vivencia simbólica, que significa como que é amado e desejado como filho. Podemos citar como exemplo a maneira que a mãe segura o bebê, ajudando a assentir sobre sua capacidade de sentir-se real.
Winnicott (1983 apud MONTEIRO, 2003,30) descreve com mais detalhes essa função da mãe:
– protege da agressão fisiológica;
– leva em conta a sensibilidade cutânea do lactante – tato, temperatura, sensibilidade auditiva, sensibilidade visual, sensibilidade à queda (ação da gravidade) e a falta de conhecimento do lactante da existência de qualquer coisa que não seja ele mesmo;
– inclui a rotina completa de cuidado dia e noite e
– segue também as mudanças instantâneas do dia-a-dia que fazem parte do crescimento e do desenvolvimento do lactante, tanto físico e psicológico.

Durante o holding o bebê encontra-se na fase de dependência absoluta, ou seja, necessita totalmente dos cuidados de sua mãe. “Por este fato, Winnicott defende que quanto mais em contato com o bebê a mãe esteja, compreendendo suas necessidades, mais o bebê tem a possibilidade de um bom desenvolvimento” (MONTEIRO, 2003).
O handling é a maneira como o bebê é tratado, cuidado, manipulado. Poder experienciar o seu corpo através do contato com a mãe.
A apresentação dos objetos “a mãe começa a mostra-se substituível e a propiciar ao seu bebê o encontro e a criação dos novos objetos que serão mais adequados ao seu atual estado de desenvolvimento” (COUTINHO, 1997, 103 apud MONTEIRO, 2003,25).
Se a mãe conseguir oferecer uma estrutura e atender as necessidades do bebê nas funções citadas acima descritas por Winnicott podemos considerar que ela esta facilitando o processo de amadurecimento do se bebê que poderá continuar se desenvolvendo nas próximas etapas do desenvolvimento de forma saudável.

TEORIA DO AMADURECIMENTO PESSOAL

Winnicott formulou uma teoria do amadurecimento pessoal normal, considerada por ele mesmo como a “espinha dorsal” (backbone) do seu trabalho teórico e clínico. A ênfase dessa teoria recai sobre os estágios iniciais, pois é nesse período que estão sendo constituídas as bases de personalidade e saúde psíquica (DIAS, 2017, 1).

Lemgruber (2005,56) cita dois fundamentos básicos que segundo Winnicott são constituídos para o processo de amadurecimento pessoal que são: a tendência inata ao amadurecimento (nature) e o cuidado suficientemente bom do ambiente (nurture).
A teoria do amadurecimento de Winnicott é composta por quatro etapas do amadurecimento pessoal:
1 – dependência absoluta;
2 – dependência relativa;
3 – rumo à independência;
4 – identidade unitária.

1 – Na dependência absoluta:
Nessa fase temos os “estágios iniciais do bebê, onde ele vive a maior parte do tempo no estado de não-integração, em dependência absoluta da mãe” (DIAS, 2017, 110).
“A etapa da dependência absoluta trata das ocorrências experienciais, num contexto de indiferenciação do bebê com sua mãe” (LEMGRUBER, 2005,58).
Nesse estágio o lactante dentro de um ambiente suficientemente bom com sua mãe atendendo suas necessidades terá como recompensa os processos de desenvolvimento não distorcidos. Desenvolvendo três tarefas: contato com a realidade, integração e percepção do corpo. Reforçando:
O relacionamento peculiar com a mãe nessa etapa fornece um padrão para as relações que o bebê possa desenvolver com a realidade externa. É no interior desse relacionamento que está sendo construída a ilusão do contato com o mundo externo, a confiança de que a comunicação inter-humana é possível, e de que a vida faz sentido (DIAS, 2017, 111).

A primeira tarefa que o bebê encontra-se envolto nessa fase é a integração.
Ressalto a importância do “gesto espontâneo” (um movimento instintual com a mão ou com a boca na direção de um suposto objeto ou um som na busca da satisfação de uma necessidade ) do bebê ser acolhido pela mãe nesse estágio, o que segundo Winnicott (1984b/1987, p 116 apud Dias, 2017, 148):
Por sua adaptação absoluta, a mãe realiza o que talvez seja a sua principal tarefa: introduzir o bebê na ilusão de que é ele quem cria o mundo de que necessita. Esta ilusão é necessária, pois “toda criança precisa tornar-se capaz de criar o mundo (a técnica adaptativa da mãe faz com que isto seja sentido como um fato); caso contrário o mundo não terá significado”.

Quando acontecem distorções ou falhas nesse estágio pode possibilitar o desenvolvimento de algumas patologias: a esquizofrenia, o autismo, o esquizóide, o Borderline e o falso si mesmo.

2 – Dependência relativa:
Nesse estágio, se tudo ocorreu bem no anterior, o bebê se tornará capaz de se relacionar com objetos não-eu, ele terá adquirido um grau de consciência da dependência da mãe e dos cuidados que ela dispensa. O bebê começa a pensar por conta própria, não necessita da mãe pensando por ele, podendo a mãe assim sair do estado de preocupação materna primária e voltar as suas atividades. Ao passo que a mãe voltando as suas atividades oportuniza ao bebê o sentido da sua autorrealização, pois a falha dessa mãe permite que o bebê chore, proteste para a realização de sua necessidade.
É preciso neste estágio um cuidado capaz de apresentar a realidade de modo não difuso,
Sem comprometer o “continuar a ser” do neném, conforme o que já vinha ocorrendo, mas, nesta perspectiva é esperado que tenha possibilidade de corresponder a necessidade da gradativa desilusão, desadaptação, permitida por causa dos recursos intelectuais que o bebê agora apresenta (LUMBREGUER,2005, 65).

Winnicott (1975, 24) cita os meios de que o bebê dispõe neste estágio, que são eles:

1. A experiência do bebê, quase sempre repetida, de que há um limite temporal para a frustração. A princípio, naturalmente, esse limite deve ser curto.
2. Crescente sentido de processo.
3. Os primórdios da atividade mental.
4. Emprego de satisfações auto-eróticas.
5. Recordar, reviver, fantasiar, sonhar; o integrar de passado, presente e futuro.

Podemos então perceber o desenvolver do bebê na sua identidade unitária, esta que só pode ser promovida pela frustração que a mãe lhe causa, dando espaço para expressar suas necessidades. Isso não significa que a mãe o esqueça mais que apenas lhe de o espaço necessário para o seu desenvolvimento. Nesse ponto podemos citar o “desmame” como diz Winnicott “implica [ter havido]uma amamentação bem sucedida, e a desilusão, uma provisão bem sucedida de oportunidade para a ilusão” (1953a/2000,p.307 apud DIAS, 2017, 281).
Uma das importantes tarefas desse estágio é a identidade unitária: EU SOU.
Quando acontecem distorções ou falhas nesse estágio de desenvolvimento pode possibilitar o desenvolvimento da depressão.

3 – Rumo à independência:
Nesse estágio podemos citar a inclusão do pai, que entra para ajudar o bebê nessa fase de integração, de ser um eu unitário, pois ele contribui para a integração da vida instintual. A criança começa a tomar consciência de sua destrutividade para com a mãe, dos seus impulsos, podendo ver os estragos que estes podem causar em sua relação com a mãe, seu objeto que sempre o amparou, diante disto, o pai lhe impõe limites, para proteger a mãe dos seus impulsos O bebê já se tornou uma criança, com consciência, principalmente de sua agressividade que pode fazê-lo perder a mãe, sendo capaz de gerar um ato reparador em sua relação. Ele se torna capaz de pedir desculpas ou simplesmente abraçá-la para não ter o perigo de perder pelos seus atos destrutivos o amor de sua mãe, começa o que Winnicott chama de Concernimento
De incompadecido (ruthless), o bebê passa a sentir-se concernido pela impulsividade que o domina nos momentos de excitação, como se dissesse: “Isto é comigo, me diz respeito, é da minha alçada”; torna-se também preocupado, pois começa a perceber que essa impulsividade atinge e pode ferir o outro; dá-se conta, portanto, que é ele mesmo que faz, de próprio punho, na mãe, “ um buraco onde, antes, havia um corpo cheio de riquezas(1955b/2000,p.363 apud DIAS, 2017, 232).

Quando a mãe fornece a oportunidade para que o “círculo benigno” – o machucar-e-remendar (hurting-mande-good) – se repita inúmeras vezes, o bebê passa, gradualmente, a acreditar na possibilidade de reparação, no esforço construtivo, e sendo-lhe dadas boas condições de suportar a culpa, torna-se mais livre para o amor instintual. “A consequência do fortalecimento, dia após dia, do círculo benigno é a de que o bebê torna-se capaz de tolerar o buraco (resultado do amor instintual). Aqui estará, então, a origem de sentimento de culpa. Esta é a única culpa verdadeira, visto que a culpa implantada é falsa para o eu” (1955c/2000, p.365). Se, como no caso de uma instituição, são muitas e alternadas as pessoas a cuidar do bebê, este perde a oportunidade da reparação – que precisa ser feita com relação à mesma pessoa que foi ferida – e o círculo benigno não pode ser constituído (DIAS, 2017, 235).

A vivência do circulo benigno resulta na tarefa tão esperada desse estágio o Concernimento.
Quando acontecem distorções ou falhas nessa fase pode possibilitar o desenvolvimento dos sintomas psicossomáticos, medo do colapso e as neuroses.

4 – Identidade Unitária:
Nesse estágio a criação do EU SOU encontra-se mais consolidada, o sentimento de ser real e de existir como identidade, “não constituem um fim em si mesmo, mas uma posição a partir da qual a vida pode ser vivida” (DIAS, 2017, 82). A criança já é capaz de saber que existe um mundo ou realidade interna.
Nesse momento é alcançado um resultado gerado pelo processo de integração que teve inicio no si – mesmo primitivo e não-integrado, ao longo das etapas iniciais, o que foi sendo integrados aspectos da personalidade que reúne o verdadeiro e falso si – mesmo. Com isso a criança foi capaz de separar-se da sua mãe, ela agora habita mais firmemente em seu corpo, já consegue perceber sua pele. Levando a para um sentido de independência.
Para que a criança venha a desenvolver todas essa afirmação do EU-SOU é necessário que tenha passado pelas etapas anteriores através de um ambiente e de uma mãe que tenham sido a ela suficientemente boa, citando Dias (2017, 245)

Se a criança atinge verdadeiramente a capacidade de vivenciar as ansiedades da situação edípica, isto significa que ela já se estabeleceu como uma identidade unitária. Firmemente integrada e tendo se tornado uma pessoa inteira, pela integração dos instintos e pela assunção da responsabilidade sobre os efeitos da impulsividade instintual, pode-se dizer que a criança não está mais sujeita ao risco da psicose. Ela tem agora saúde psíquica suficiente para fazer a experiência das dificuldades inerentes à vida instintual no quadro das relações triangulares e interpessoais (DIAS, 2017, 245).

Caso contrário iremos encontrar falhas que irão trazer dificuldades a novas conquistas para a criança e possibilidades de desenvolver patologias.

É importante ressaltar que mesmo se tendo um bom começo os indivíduos mais tarde se forem expostos a situações traumáticas, além de suas capacidades de tolerá-las no momento, ou que duram um tempo demasiadamente longo para o que são capazes de suportar, podem chegar a desenvolver uma psicose (DIAS, 2017, 245).

Para encerrar esse tema sobre os estágios apresento um esboço do Instituto Brasileiro de Psicologia Biodinâmica do que acontece com a criança e a mãe durante essas etapas do amadurecimento para Winnicott:

Figura 1 – Etapas do Amadurecimento Pessoal

Fonte – Instituto Brasileiro de Psicologia Biodinâmica – IBPB

REMATERNAGEM COMO RECURSO BIODINÂMICO

A Psicologia Biodinâmica surgiu através da psicóloga e fisioterapeuta norueguesa Gerda Boyesen, que ao ingressar em terapia com Ola Raknes, a partir de sua análise, foi percebendo a necessidade de se trabalhar corpo e mente de maneira integrada.
A Biodinâmica vê o individuo como ser único, com suas particularidades, enfatiza a proposta de fazer amizade com a resistência e dissolver as couraças sem quebrá-las, através da massagem biodinâmica, valoriza a intenção no toque e o uso de técnicas especificas para atender as necessidades de cada paciente.
Para desenvolver a Psicologia Biodinâmica no início Gerda foi trabalhando a partir de suas experiências e de como o fluxo energético ia ocorrendo no corpo.
“Sua teoria é que a força vital move-se em nós como libido, e que seu fluxo é inerentemente prazeroso; quando, porém, esse fluxo é bloqueado, causa sintomas tanto físicos como psicológicos” (Southwell, 1986,5).
Gerda compreendeu que além de dar atenção apenas aos relatos verbais que o paciente trazia para o atendimento, era necessário perceber como seu corpo reagia perante os relatos e também como seria apenas perceber a reação do corpo com pequenos toques. Percebeu que certos toques geravam modificações em seus pacientes. A partir disso começou a se aprofundar principalmente pessoalmente em ouvir os sons que o seu corpo ia gerando, definindo como sons psicoperistálticos, passou então a fazer uso do estetoscópio sobre o abdômen do paciente, a partir dai a massagem passou a ser guiada pelos sons psicoperistálticos.
A Biodinâmica nos oferece recursos que podem ser trabalhados para cada paciente, porém todos possibilitam atingir o mesmo objetivo, acessar conteúdos inconscientes. Esses recursos podem ser: o trabalho verbal, a massagem, a leitura corporal, exercícios corporais adaptados e o colo biodinâmico. O carro chefe da Biodinâmica é sua massagem.
Massagem biodinâmica é um método de tratamento criado pela Gerda Boyesen e faz parte da Psicologia Biodinâmica. Pode ser utilizada durante o trabalho verbal, com exercícios e só a massagem, sendo este um recurso que pode ou não ser utilizado, dependendo do paciente.
A massagem pode ser utilizada como um meio de acessar os conteúdos inconscientes, pois quando a pessoa deita acaba a censura, as defesas ficam mais brandas, permitindo o acesso das questões que poderiam levar tempo pra acessar apenas na terapia ou talvez não fossem acessados, também auxilia no autoconhecimento, permitindo que o paciente perceba seu próprio corpo e assim aumentar a consciência de suas necessidades, desejos, sentimentos e emoções (REGO, 2014).

Com a abordagem Biodinâmica temos várias formas de chegarmos aos conteúdos que causaram os traumas dos pacientes. Visando a rematernagem, cito ainda a amizade com a resistência e o trabalho com a transferência negativa que possibilita uma maior ressignificação nesse contexto. Assim:
Resistência é o paciente criando formas para proteger seus conteúdos recalcados, conteúdos estes que não estão preparados para serem acessados, estes conteúdos geram problemas comuns e frequentes no dia a dia do paciente, por isso tem se a necessidade do terapeuta fazer a amizade com a resistência do paciente ( GERDA,1986).
Sendo amizade com a resistência:
Fazer a amizade com a resistência é durante a massagem respeitar as resistências, saber que o momento é do paciente, com isso o paciente vai desarmando as resistências, ou seja, vai deixando de ter controle e com isso se entrega na massagem (REGO, 2014).
Referente à transferência:
A transferência, isto é, o estabelecimento de relações com o analista que se traduzem em manifestações de ódio, amor ou medo. Mais essas atitudes que se dirigem ao analista em situação analítica, são apenas repetições de outras, de mais antigas, na maioria infantis, em relação a pessoas que, na infância, tiveram para o paciente, em determinada altura, significado especial (REICH,1998,18).

Transferência negativa: “As transferências negativas, isto é, as atitudes de ódio projetadas sobre o analista” (REICH, 1998,19).
Finalizo com a frase marcante que Gerda Boyesen nos ensinou e que tanto nos possibilita sermos analistas “suficientemente bons”: “O pouco é muito” significa que o terapeuta deve ter cuidado, ser paciente e prudente ao se aproximar da resistência de seu paciente, para que não gere mais resistências e angústias. Ele deve tentar acessar tais resistências no tempo do paciente, sem pressioná-lo, atendendo as necessidades do paciente e não do analista, por isso a frase de que “o pouco é muito”, pois é aos poucos que baixa a resistência e acessa os conteúdos inconscientes, sem assustar o paciente.

DISCUSSÃO

Diante do levantamento bibliográfico, podemos repensar na rematernagem da abordagem Biodinâmica de ser a capacidade do analista compreender a dor pelo qual seu paciente passou, identificando principalmente as fases de amadurecimento pessoal onde ocorreram as falhas maternas e ser capaz de realizar o papel desta função materna para oferecer a possibilidade de uma ressignificação dos traumas que foram gerados neste período.
Diante disso vemos a necessidade do analista captar os mecanismos emocionais que seu paciente utiliza fazendo amizade com suas resistências e através do método da parteira poder trabalhar em conjunto com o paciente para dissolvê-los e encontrar os conteúdos reprimidos e desvendar o motivo de suas dores emocionais.
Na abordagem Biodinâmica existem os recursos dos quais podemos dispor para auxiliarmos o paciente na compreensão e resolução dos seus conflitos, podemos utilizar na sessão o relato e também podemos utilizar da massagem biodinâmica.

“Por vezes a massagem biodinâmica é uma técnica que pode mobilizar conteúdos emocionais recalcados, que serão elaborados durante o processo terapêutico. Outras vezes, a massagem é um poderoso instrumento terapêutico, que pode dar ao paciente a sensação de ser segurado, nutrido, ninado, protegido e vinculado, reparando aspectos da falha materna” (CINTRA, 2000).

Podemos com a rematernagem que é a maneira do analista suprir uma falha materna propiciar ao paciente uma construção positiva das falhas que ocorreram no período do seu amadurecimento pessoal desenvolvendo o seu potencial criativo.
O analista pode enquanto auxilia seu paciente no processo assumir o papel da “mãe suficientemente boa”, vivência em que o paciente pode não ter recebido e experienciado durante a sua maternagem, pois o paciente pode ter sofrido a falta de uma “mãe suficientemente boa”, com isso ajudá-lo nessa função, através de um ninar, da presença, do aconchego da massagem ou apenas oferecer proteção. Podemos aqui citar a importância da presença terapêutica para o desenvolvimento desta rematernagem, pois o analista aqui acolhe os sentimentos sem censurá-los. Tendo sempre em mente a amizade com a resistência, pois para um adulto é difícil compreender que estas falhas ocorreram lá na sua fase de desenvolvimento, o importante é o analista estar atento as resistências que surgem durante o processo e ir trabalhando sem invadi-los.
Tanto a amizade com a resistência quanto a transferência negativa criam um ambiente “suficientemente bom”, onde a amizade com a resistência seria a não invasão, o ser respeitado e atendido em suas necessidades referente ao período de não integração no estágio da dependência absoluta.
A transferência negativa vem com a possibilidade de vivenciar o circulo benigno que trás a possibilidade de criar o Concernimento, onde o paciente expressa suas raivas e frustrações para com o analista e este permanece na relação sem julgar ou retaliar. Propicia o fechamento do ciclo benigno, resgatando a sua capacidade de sentir-se amado e amar.
A amizade com a resistência e a vivencia da transferência negativa em conjunto com o método da parteira, possibilita o atendimento das necessidades do paciente dentro do seu tempo psíquico, podendo facilitar um reencontro com a personalidade primária do paciente e este criar um novo significado para sua existência.
Todo esse processo aqui relatado chamado de “rematernagem” demonstra que o essencial nesse momento é o analista respeitar as necessidades e o momento de cada paciente, não tentando realizar suas próprias expectativas, pois cada paciente tem o seu tempo e o analista deve ajudá-lo a perceber suas emoções e as sensações em seu corpo. Deve ser um facilitador desse processo assim como a “mãe suficientemente boa” apresenta o mundo ao bebe o analista apresenta o verdadeiro Eu para o paciente.

CONCLUSÃO
A importância da mãe na vida do ser humano acontece desde a sua concepção, porém neste trabalho ressalto a necessidade dela em torno da fase de amadurecimento pessoal.
Pude notar a importância de a mãe ser capaz de ser o que Winnicott chama de “mãe suficientemente boa”, o que podemos traduzir como aquela que supre as necessidades do bebê, protegendo, ninando e estando de prontidão para que ele se desenvolva num ambiente saudável.
Quando a mãe não consegue estar ativamente e presente para atender as essas necessidades e assim acontecem as falhas no desenvolvimento do bebê.

Para Winnicott (1983 apud CINTRA, 2000), “o que traumatiza é a repetição da falha materna (tanto da mãe pessoa como da mãe ambiente). (…) A mãe suficientemente boa é monótona e adapta-se ativamente aos ritmos e às necessidades do bebê, sem se ressentir por isso. Ela cria um ambiente emocionalmente estável e protegido de excessos de estímulos sensoriais (luz, som, temperatura, movimentação, etc.), evitando choques” – ou o reflexo de sobressalto que, para Gerda (1986 apud CINTRA, 2000), é o que perturba a circulação libidinal, gerando padrões de stress e as couraças como forma de defesa.

Sendo assim podemos ressaltar a importância do analista que ao atender seu paciente em suas necessidades e criar um vínculo na função maternal, mantenha-se sempre focado e atento para as questões maduras do paciente a serem trabalhadas, para evitar as couraças secundárias e repetir uma invasão de sua história de vida..
Importante que o analista consiga atender ao paciente, ou seja, os que sofreram falhas nas fases de maternagem e amadurecimento precisam ser cuidados, e com isso o terapeuta deve estar atento para através da rematernagem ser capaz de, um ninar, de proteção, de um colo ou de um “simples” abraço reparentar o paciente.
É através de um analista na função da “mãe suficientemente boa” no atendimento, que poderá auxiliar o paciente a superar e ressignificar falhas que tenham sido causadas no seu processo de desenvolvimento, principalmente nas etapas de amadurecimento pessoal.
Concluo ressaltando a importância da Psicologia Biodinâmica e seus recursos na realização do processo de “rematernagem”. Onde a compreensão das resistências, o estar atento as transferências, a massagem e a presença terapêutica que acontecem no atendimento, facilitam o vinculo analista–paciente que juntos possibilitam ao paciente encontrar um ressignificado para sua história de vida.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOYESEN, Gerda. Entre Psique e Soma: Introdução a Psicologia Biodinâmica. 2. ed. São Paulo: Summus Editorial, 1986. 192 p.
CINTRA, Gloria. Rematernagem: uma experiência de simbiose construtiva. 2012. Disponível em: <https://massagembiodinamica.com.br/wp-content/uploads/2012/08/rematernagem-dora.pdf>. Acesso em: 15 jan. 2018.
CINTRA, Glória. Gerda Boyesen, a mãe suficientemente boa descrita por Winnicott. 2000. 21 f. Monografia (Especialização) – Curso de Psicologia Biodinâmica, Instituto Brasileiro de Psicologia Biodinâmica, São Paulo, 2000. Disponível em: <http://ibpb.com.br/?page_id=146>. Acesso em: 29 nov. 2017.
DIAS, Elsa Oliveira. A teoria do Amadurecimento de D.W.Winnicott. 4. ed. São Paulo: Dww, 2017. 328 p.
LEMGRUBER, Isabel de Oliveira Castro. Um olhar para Winnicott: o ambiente e a dependência. 2005. 91 f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Psicologia Clínica, Psicologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2005. Disponível em: <https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/6976/6976_5.PDF>. Acesso em: 27 dez. 2017.
MONTEIRO, Mayla Cosmo. Um coração para dois: a relação mãe-bebê cardiopata. 2003. 103 f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Psicologia, Psicologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2003. Disponível em: <https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/4350/4350_5.PDF>. Acesso em: 27 dez. 2017.

REGO, Ricardo et al (Org.). O toque na Psicoterapia: Massagem Biodinâmica. Petrópolis: Kbr, 2014.
REICH, Wilhelm. Análise do Caráter. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.491 p.
SOUTHWELL, Clover. Teoria e métodos de Gerda Boyesen. 1986. Disponível em: <http://ibpb.com.br/?page_id=146>. Acesso em: 25 jan. 2018.
WINNICOTT, D. w.. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975. 244 p.
WINTER, Themis Regina; DUVIDOVICH, Ernesto (Org.). Maternagem Uma Intervenção Preventiva em Saúde: Abordagem Psicossomática. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004. 116 p.

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