Entrevista com Gerda Boyesen

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A entrevista que se segue foi feita com o intuito de registrar algumas idéias dessa grande personalidade dentro das psicoterapias corporais que é Gerda Boyesen. Criadora da Psicologia Biodinâmica, Gerda Boyesen, aos 74 anos, continua trabalhando ativamente. Esta entrevista foi cedida entre o final de um “workshop”, durante seu almoço – um sanduíche – e os atendimentos individuais, num dia que terminou com uma festa de encerramento desse “workshop” (da qual participou quase até o fim)! Mais uma vez pude testemunhar sua generosidade e disponibilidade ao aceitar ser entrevistada em tão complicadas circunstâncias. ENTREVISTANDO GERDA BOYESEN

Por: Vera Iaconelli e André Samson – 1996

Deve-se levar em consideração que a entrevista só foi colocada no corpo dessa dissertação por ser um relato de uma pessoa que tem muito a nos ensinar e cujas palavras precisam ser registradas a cada oportunidade para que não percamos suas descobertas, pois como veremos, há bem pouco material registrado dessa autora. No entanto, a gravação apresentou problemas de registro devido a ruídos externos, ao fato da senhora Boyesen não estar falando em sua língua materna (ela é norueguesa e a entrevista foi em inglês) e o meu nervosismo ao manusear o gravador num momento tão importante. Deixei que falasse livremente – não poderia pressioná-la mais ainda! – o que fez com que o material colhido acabasse por não ser referente ao tema a que me propus, mas sua utilidade é maior na medida em que pode cumprir a pretensão de registro acima citada. Além da entrevistada e de mim, estava presente um professor do Instituto de Psicologia Biodinâmica Brasileiro com a finalidade de auxiliar na compreensão da língua.

PSICOLOGIA BIODINÂMICA POR GERDA BOYESEN

Londres, Acacia House, setembro de 1996 V: Fala-me sobre a Psicologia Biodinâmica, se possível, apresente-a. Gerda Boyesen: As raízes de onde se parte são Freud e Reich. Assim, nós viemos da Psicanálise e da psicoterapia corporal reichiana. E porque eu fui treinada pelo Dr. Raknes (1), que era tão próximo de Reich, seu aprendiz. E, então, nós temos a massagem. Haviam realmente duas disciplinas diferentes: as massagens de vários tipos e a psicanálise freudiana. No Instituto Bülow-Hansen, onde eu treinei a massagem, a massagem tornou-se mais psicológica e dinâmica e a psicoterapia reichiana mais corporal e próxima da massagem. Essas duas diferentes disciplinas estavam se aproximando. A massagem tornando-se mais psicodinâmica, próximo do que chamamos Biodinâmica, e a psicoterapia vinda de Reich mais corporal e próxima da massagem. Assim, nós nos aproximamos. E, para mim, eu primeiro me tornei psicóloga clínica e, então, tornei-me uma terapeuta analista reichiana e daí eu tive que aprender fisioterapia para aprender a trabalhar com os músculos e, então, eu entrei na massagem dinâmica. No centro de tudo isto está o que nós chamamos de psicoperistalse. Ouvindo a psicoperistalse é que a Biodinâmica começa. E porque eu descobri – o que ninguém havia descoberto – que nossos intestinos têm uma digestão de alimentos e uma outra digestão da tensão. Como minha filha disse uma vez, Reich estava como o “gato próximo ao mingau quente”(2). Ele sabia que havia algo importante no estômago, na barriga, mas ele não sabia o que era. Psicoperistalse é um conceito muito importante para a Biodinâmica. É o conceito principal. O segundo conceito importante é do fluido energético, porque Reich descobriu a energia cósmica, que chamamos de energia orgone e os reichianos falam sobre estase, que é a energia bloqueada. Na medicina, eles agora acharam que há um fluido nas paredes do intestino, mas não sabem o que é. O Prof. Dr. Setekleiv(3) descobriu e fez uma pesquisa sobre os sons peristálticos. Ele encontrou dois sons peristálticos: um vindo do conteúdo do intestino e o outro do fluido das paredes do intestino, mas o fluido nas paredes intestinais é o mais importante porque é a energia do que nós chamamos de canal do Id, canal primitivo, original e canal emocional. Assim, essa energia na parede, o fluido nas paredes, que ele encontrou, é o fluido energético. Porque Reich… eu fui a primeira a ouvir o canal emocional ou canal instintivo, que é nosso primitivo e básico, o canal. Se você pensa sobre a ameba, que movimenta, e na sua pulsação como estrutura animal primitiva mais próxima e a energia vai para as paredes do tubo animal e na ameba vai ao redor do círculo e assim você tem a pulsação. A pulsação da ameba é dessa forma (mostrando o movimento pulsatório) e no trato animal você tem a pulsação. O canal intestinal é realmente como o tubo animal e então você tem 6 ou 7 metros. E, assim, aqui Biodinâmica se embasa na Biologia e Anatomia. E isso é importante, e é por isso que eu chamei de Psicologia Biodinâmica, mas também chamei de Biopsicologia. (interrupção) (1) Ola Raknes, vegetoterapeuta norueguês, discípulo de Reich (2) “The cat goes around the hot porridge”.

(3) SETEKLEIV, Johannes. A Atividade Rítmica Espontânea na Musculatura Lisa. In: Boyesen, G. e outros. Cadernos de Psicologia Biodinâmica. v.1. Trad. George Schlesinger, Ibanez de Carvalho Filho e Maria Sílvia de Souza Camargo. São Paulo, Summus, 1983. p. 93-103

Assim, nós estamos chegando ao conceito de fluido energético e aqui não significa que Reich estivesse consciente. Ele descobriu uma lei muito importante, quando ele descobriu a energia cósmica ou energia orgone. Ele descobriu que a energia atrai fluido, que é o fluido energético. ( … ) Kardec disse que tudo se refere ao fluido energético. Assim, o fluido energético é um conceito principal, mas ele só falava do fluido energético, agora nós descobrimos que a psicose é fluido no cérebro. Eu afirmo que é fluido energético no cérebro. E Reich talvez tenha dito que era energia no cérebro. Através do meu conceito de fluido energético eu descobri o elo perdido na ponte entre as novas terapias, os reichianos e os neorreichianos e a Psiquiatria e a Medicina. Assim, eu vim de Oslo para Londres porque eu tentei explicar isso a doutores e psiquiatras noruegueses, mas todos disseram que nós estamos “por fora” dos seus resultados, mas não estamos interessados na sua teoria porque vai causar uma reação contra…, eles vão juntos até um ponto e depois dizem, já chega. Outra importante teoria é do canal eletrolítico, que eu descobri, acho que em 1972, e agora vem sendo pesquisada por Max ( … ), de Munique. Ele recebeu o prêmio Nobel sobre o canal eletrolítico. Do que se trata? Trata-se de energia em movimento. Eu acho que existem duas energias emocionais. Você precisa pensar em duas polaridades: terra e céu ou para cima ou para baixo, vindo do crânio ou sacro…, seja como for. São as polaridades. Assim, você tem a pulsação que vem de cima e de baixo. Mas quando a energia segue por dentro do canal emocional, então ela vai para cima nesse sistema, mas, ao mesmo tempo, na pele e em todo o organismo e é isso o que eu chamei de energia vermelha, porque a energia vermelha é a energia da Terra – você tem o fogo -, energia animal, canal animal e a outra que desce, eu chamei de canal espiritual. Na acupuntura eles falam sobre isso… esses dois canais. E eu chamei de canal eletrolítico. E acho que está perto. Acho que está perto também da pesquisa psiquiátrica da bioquímica que mostrou que a psicose é fluido no cérebro. No Congresso Internacional de Bioquímica ( … ) onde eles descobriram que with Corrector where fragrances. To I’ve duplicate in.

neuroses e psicoses estavam fluindo entre o fim dos nervos e os músculos ( … ) nos músculos e quando estão fluindo lá você tem a depressão neurótico e psicossomática. Eles estão usando psicofármacos que reduzem o fluido e os sintomas. Não importa o que medicina usar, mas eles reduzem os sintomas através do uso de drogas, com uma couraça farmacológica, que pode acabar a qualquer momento, porque a oposição está lá. O que nós fazemos é conscientizar o material subindo do inconsciente e trazendo toda ab-reação ou integração cognitiva e também completando o ciclo vasomotor, você tem o aumento do simpático e a redução do parassimpático. Pode-se fazer o ciclo todo, pode ser …descarga . Se não subir… assim a tensão e relaxamento com descarga emocional ou descarga vegetativa e aqui, temos também, um conceito muito importante. (interrupção)

Professor da Biodinâmica: O que ela está falando é que as drogas inibem o ciclo vasomotor. Você tira o fluido energético, mas, de uma forma, cria uma couraça artificial. Na Biodinâmica não. Você faz um trabalho de fazer o ciclo completo. Gerda Boyesen: Aqui nós chegamos perto de Reich. Reich descobriu a relação tensão e relaxamento. Tensão – descarga – relaxamento. E na Biodinâmica, e eu me detive mais detalhadamente e com mais profundidade no entendimento biológico energético e psicológico, porque o que faz a descendente é a psicoperistalse. A psicoperistalse é o mecanismo que faz a energia vermelha ascendente, a energia emocional, transformar-se na descendente. Quanto mais a ascendente não for parada, mais problemas você terá: depressão, medo, ansiedade, dores psicossomáticas, tudo, porque ela fica parada na ascendente e não sai. Mas ache a psicoperistalse e você pode encontrar a continuidade do ciclo completo. Você volta… a psicoperistalse trabalha em todo o sistema mas você não esquece disso. (…) Nós (..) da repressão fora tudo e você não tem que lembrar, porque ele ( … ) e então o ciclo tudo …na harmonia o que nós chamamos de qualidade celestiais. Você vai da irracionalidade para a racionalidade, do medo para a paz, da dor para o prazer. Porque esta ascendente é para nossa sobrevivência, tensão do medo e luta e a outra é para a paz e harmonia. V: Sobre a auto-regulação, na biodinâmica parece que a atitude é mais coerente com essa visão de que tendemos para a auto-regulação e harmonização. Existe uma facilitação dessa auto-regulação. Gerda Boyesen: Mas existem pessoas tão distantes de si mesmas porque elas tem tanta couraça e então eles não sabem mais como alcançar a auto-regulação. Mas aqui, na Biodinâmica, podemos trabalhar com a couraça porque como nós tocamos o corpo, então nós podemos sentir o que o corpo precisa. Você pode entrar na auto-regulação. Por exemplo, tantas pessoas morrem de ataque cardíaco porque elas trabalham mas não conseguem mais sentir quando estão cansados. Porque não estão em contato com o corpo. Quanto mais você está em contato com o corpo, mais está apto a auto-regulação. O que é novo na Biodinâmica é que nós encontramos o mecanismo da auto-regulação, que está ligado aos músculos e com a mente. E nós criamos um método onde nós conseguimos influenciar a auto-regulação. ( … ) Por exemplo, na Noruega 25 anos depois da guerra, pessoas que estavam na marinha durante a guerra em navios não de guerra, mas navios mercantes pediram ao governo e ao Ministério da Saúde para que pagassem a eles uma indenização porque eles eram inválidos de guerra. O governo disse que eles não haviam estado na guerra e, portanto não tinham direito a indenização. P.B.: Eles pediram uma indenização do governo, mas o governo disse que eles não estavam na guerra, o navio deles não foi afundado.

Gerda Boyesen: No final o governo teve de aceitar e dizer — sim, vocês merecem. O que foi? Eles não haviam lutado, mas estavam em tensão permanente porque tinha que olhar o tempo todo os navios de guerra e as bombas e… Assim, eles estavam tensos o tempo todo. E na minha teoria, porque eles estavam tensos, a psicoperistalse não funcionava. (..) Você pode viver sem psicoperistalse mas não pode viver sem peristalse. Mas sem psicoperistalse a tensão no corpo enche, enche e enche e o “copo fica cheio demais” e você adoece: neurose e psicossomatização. Esta tensão, você sabe, a função da psicoperistalse pode parar e não trabalhar mais. E é quando você (..) psicologicamente doente. Nós estamos falando de uma nova expressão. Falamos de auto-regulação, mas falamos também de auto-regulação psicoperistáltica. E está é a interna e a outra é externa, mas se você tem a auto-regulação externa isto trabalhará no seu intestino, auto-regulação interna se já não estiver perturbada, como durante a guerra, por exemplo. V: O “setting” Biodinâmico, que envolve a maca, o colchão e a cadeira como três níveis de contato com o cliente. Contato com o terapeuta, mas, principalmente níveis de contato consigo mesmo. Gostaria de saber sobre os diferentes níveis em que se trabalha o cliente e os diagnósticos envolvidos nessas diferentes propostas do terapeuta. Gerda Boyesen: Não podemos esquecer que a matriz também é a técnica de Freud. Porque aqui está o que todos esquecem, que você pode deitar-se lá sem estar em contato ( … ) da vegetoterapia. Você pode usar como Freud fez. E isto desapareceu e eu luto para trazer isso de volta. Eu quero mostrar que a Biodinâmica está diretamente conectada com Freud, não apenas com Reich. E isto é importante, porque está diretamente ligado ao trabalho original de Freud da livre associação, antes de ele começar todo suas coisas. Então, com a transferência. Porque ele começou com a fala e isso é importante. É uma coisa estranha da Biodinâmica… eu não faço constantes diagnósticos. E eu vou falar-lhe também (interrupção) V: A senhora gostaria de parar? Gerda Boyesen: Obrigada, mas eu gostaria de saber mais sobre essa idéia de um diagnóstico constante. V: Parece que ela leva em consideração o aqui e o agora do cliente a cada momento tendo três formas diferentes de trabalhar. Gerda Boyesen: Não, é mais simples do que isto. Eu faço mais meu diagnóstico sobre como ele fala quando ele fala e explica onde ele está. Eu não uso o caráter como diagnóstico porque eu sou contra isso. Isso não vai com o trabalho Biodinâmico. Primeiro porque esta confrontação não é boa, não faz bem ( … ) psicoperistalse. Segundo é que as pessoas não abrem suas cabeças e esquecem aonde estão. (interrupção)

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