Transtorno do pânico: O uso do toque como resgate do vínculo afetivo

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Monografia apresentada ao Instituto Brasileiro de Psicologia Biodinâmica para a conclusão do curso de formação em Análise Biodinâmica.

Coordenadora: Gloria Cintra

São Paulo
2017

“Cool em sua maneira de fazer e de ser, liberado da culpabilidade moral, o indivíduo narcisista é, no entanto, propenso a angústia e ansiedade. O drama é mais profundo que o pretenso desapego cool: homens e mulheres seguem aspirando à intensidade emocional das relações privilegiadas, mas quanto mais forte é a expectativa mais raro parece tornar-se o milagre fusional, ou em todo caso, mais breve…
Porque não posso amar e vibrar?”
Gilles Lipovetsky, em A Era do Vazio (Relógio D’agua, 1983)

“Num final de tarde, poucos anos atrás, eu mergulhei na escuridão. Estava nos estúdios da emissora onde trabalho quando percebi a realidade se afastando de mim. Nada acontecia de especial naquele dia, nenhuma chateação além das habituais… Só que no momento de partir , eu não conseguia fazer os movimentos corriqueiros…colocar minhas roupas pessoais, pegar o carro e sair dali. (…) Fui mergulhando cada vez mais fundo nos abismos turbulentos de um universo que me engolfava rápida e violentamente. Em um soberano esfoço, me veio o número de uma amiga:” Estou caindo da vis, vem me salvar”.(…) O que passou, compreendi depois, foi algo bastante comum que chamam de ataque de ansiedade ou de pânico e foi um dos maiores medos da minha vida. (…) Jurei naquela noite que jamais me permitiria outro momento semelhante, e até hoje, benzadeus, não descumpri o combinado.”
Maitê Proença, em Entre ossos e a escrita (Ediouro, 2004)

INTRODUÇÃO

Esta monografia tem como objetivo abordar o transtorno do pânico, e como a Biodinâmica, embasada na teoria Winnicotiana, pode colaborar na restauração do vínculo afetivo por meio do toque.
Sensação de morte iminente, tremores, taquicardia, suor frio, falta de ar, dor no peito, tontura, náusea…esses são alguns dos sintomas que fazem com que o paciente tenha a certeza de estar tendo um ataque cardíaco ou um acidente vascular cerebral, e que não sairá dessa. Não raro, dirigem-se à hospitais, passando por exames onde nada é encontrado.
Na verdade essa é a manifestação mais aguda dos sintomas de ansiedade, onde se intensifica a ativação dos mecanismos de defesa do organismo e preparam o corpo para a fuga de uma ameaça, que nesses casos, não existem.
O que mais aterroriza é o fato de não ter aviso. O ataque chega sem sinais premonitórios e passa a dominar a vida das pessoas. Esse fato de não ter previsão, pode fazer com que a pessoa desenvolva uma ansiedade maior quanto à situação e o local onde o próximo ataque acontecerá.
“De forma bem sucinta: o nome pânico foi adaptado do grego panikon e derivado do nome do deus Pã, figura mitológica grega, divindade das montanhas e das florestas, protetor de pequenos animais, pastores e caçadores. Apesar de ser travesso, galanteador e de sempre empunhar uma flauta feita de caniços do brejo, era rejeitado por sua feiura. Metade homem e metade animal, com chifres, patas e pelos de bode, Pã aterrorizava as pessoas com suas apariçoes inesperadas. Desta forma surgiu a palavra “pânico”, o terror infundado ou repentino” ( Silva, Ana Beatriz B., 2011).
Segundo CAMARGO, Andréia (2013) o transtorno do pânico ocorre independente da classe social, cor e crença, e isto significa que já havia uma pré-disposição interna, pois que já estava sendo formada durante o percurso de vida do indivíduo, esperando apenas o momento certo para desencadear.
Embora Winnicott não tenha estudado o pânico propriamente dito, segundo CINTRA, Glória (2008), o bebê que não teve mãe suficientemente boa passa a sofrer de angústias impensáveis, medo: de se despedaçar, de cair para sempre, do colapso, O ambiente e a mãe-ambiente não foram capazes de suprir as necessidades básicas dele que está num estado de dependência absoluta, isto é, o ambiente não foi confiável e o desenvolvimento emocional é perturbado. Na Síndrome do Pânico, o paciente sofre do medo do colapso, pois seu ambiente corporal interno não é mais confiável, uma vez que os ritmos orgânicos estão desorganizados. Ele sente o mundo interno e externo como ameaçador. Qualquer pequeno estímulo pode desencadear fortes reações psicossomáticas.
Nesse sentido a proposta da Biodinâmica incentiva o autoconhecimento percebendo cada pessoa como única, onde corpo e mente fazem parte de um mesmo organismo. Dessa forma, há a possibilidade de haver um processo que busca a reparação das falhas no manejo materno.

CAPÍTULO 1
EMBASAMENTO TEÓRICO

“…Todo o indivíduo está, na verdade, tentando encontrar um novo nascimento, no qual a linha de sua própria vida não seja perturbada por um reagir em maior escala do que aquele que pode ser experimentado sem uma perda do sentido de continuidade da existência pessoal (WINNICOTT, [1949] 1978, p. 333).

“…apresenta características inconscientes relacionadas a buracos no self
(centro de sustentação interna), resultados de sucessivos esvaziamentos (rupturas
intraself) durante os processos de desenvolvimento e de crescimento.
(TRINCA, 1997, p. 15)
1. Transtorno do Pânico

Segundo SILVA, Ana (2011), o DSM-IV-TR, um ataque de pânico é um período inconfundível, de imenso medo ou temor, no qual quatro ou mais dos sintomas listados abaixo se desenvolvem de forma abrupta. O ataque atinge o ápice (pico) em 10 minutos e costuma se estender por aproximadamente 40 minutos:
• Palpitações ou taquicardia (ritmo cardíaco acelerado);
• Sudorese intensa (suor, pricipalmente na face ou cabeça);
• Tremores ou abalos musculares;
• Sensação de falta de ar ou sufocamento;
• Sensação de asfixia ou “nó” na garganta (aperto);
• Dor ou desconforto no peito;
• Náuseas (enjoos) ou desconforto abdominal (similar à cólica);
• Sensação de tontura, vertigem, desmaio;
• Sensação de irrealidade (estranheza do ambiente) ou de despersonalização (estranheza consigo mesmo)
• Medo de perder o controle dos seus atos ou de enlouquecer;
• Medo de morrer
• Sensação de anestesia ou de formigamento (parestesias);
• Calafrios ou ondas de calor.
Segundo CAMARGO, Ana (2011), de acordo com o CID-10 no transtorno do pânico (F41.0) os aspectos essenciais são ataques recorrentes de uma ansiedade grave, os quais não estão restritos a qualquer situação ou conjunto de circunstâncias em particular e que são, portanto imprevisíveis.
De acordo com SILVA, Ana (2011), a sensação vivida pelas pessoas que sofreram seu primeiro ataque de pânico é algo como a fábula da Cinderela. De um instante para outro perdem todo o glamour do luxo, da realeza, do amor, da música e se deparam com um balde de água suja, um trapo de pano, uma vassoura velha quase careca. É dormir rico e acordar pobre. Esta é a sensação após o primeiro ataque de pânico: perder toda a sanidade numa mesa de pôquer.
Ainda segundo a autora, através dos séculos, observamos que as pessoas têm sofrido de ataques de pânico há muito tempo. No século XVI, na França, eram denominados terreur panique. Em 1603 (século XVII), um médico inglês descreveu assim um ataque de pânico: “Tolos tremores repentinos, sem qualquer causa precisa, aos quais eles chamam de terrores de pânico”. Sigmund Freud foi um dos primeiros a fazer uma descrição minuciosa e apurada dos ataques de pânico. Em 1884 ele os chamava de “ataques de ansiedade” em vez de ataque de pânico. Entre o final do século XIX e a década de 1980, tanto a medicina quanto a psicologia praticamente ignoraram os ataques de pânico. Finalmente, a partir de 1980, a Associação de Psiquiatria Americana (APA) incluiu os ataques de pânico na terceira edição do DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais).
Atualmente nos Estados Unidos, estima-se que 23% da população sofra ao menos um desses ataques ao longo da vida. Dos sintomas de ansiedade, podemos dizer que é a manifestação mais aguda, pois é a intensa ativação dos mecanismos de defesa do organismo que preparam o corpo para a fuga de uma ameaça, que na maioria das vezes, não existe.
Observando dados sobre o pânico, que contraria o senso comum, é que ele ocorre com a mesma frequência nos grandes centros urbanos como nas zonas rurais. Temos a ideia que as pessoas da “Cidade Grande” estão mais vulneráveis a sofrer de transtornos de pânico, mas essa percepção é desfeita, nos fazendo pensar que o estresse afetivo talvez, seja de fato, a grande ignição desse motor chamado pânico.
2. Winnicott

De acordo com biografia publicada no site da Federação Brasileira de Psicanálise, DONALD WOODS WINNICOTT foi pediatra e psicanalista, colaborador de jornais médicos, psiquiátricos e psicanaliticos. Segundo a publicação, sua extensa obra foi dedicada à construção da teoria do amadurecimento pessoal (um caminho a ser percorrido partindo da dependência absoluta e dependência relativa rumo à independência relativa), que, além de constituir uma teoria da saúde, com descrição das tarefas impostas, desde o início da vida, pelo próprio amadurecimento, configura também o horizonte teórico necessário para a compreensão da natureza e etiologia dos distúrbios psíquicos.
A teoria de Winnicott baseia-se no fato de que a psique não é uma estrutura pré-existente e sim algo que vai se constituindo a partir da elaboração imaginativa do corpo e de suas funções – o que constitui o binômio psique-soma. Essa elaboração se faz a partir da possibilidade materna de exercer funções primordiais como o holding (permite a integração no tempo e no espaço), handling (permite o alojamento da psique no corpo) e a apresentação de objetos (permite o contato com a realidade).
O psique-soma inicial prossegue ao longo de uma linha de desenvolvimento desde que sua continuidade de existência não seja perturbada, e para que isso ocorra, é necessário um ambiente suficientemente bom onde as necessidades do bebê sejam satisfeitas.
Um ambiente mau é sentido como uma invasão à qual o psicossoma (o bebê) precisa reagir e esta reação perturba a continuidade de existência do bebê. O adoecimento, então, se dá devido a perturbações na relação mãe-bebê que provocam falhas no desenvolvimento do indivíduo. Tais perturbações criam uma sensação de falta de fronteiras no corpo, ameaças de despersonalização, angústias impensáveis, ameaças de desintegração e despedaçamento, de cair para sempre, e falta de coesão psicossomática.
Winnicott não abordou o pânico propriamente dito, mas ao observarmos sua contribuição no âmbito do desenvolvimento precoce do ser humano, é possivel relacionar suas teorias às causas do pânico.
Segundo SANTOS, Eder (2011), as angústias dos estágios mais iniciais, em Winnicott, podem ser definidas como impensáveis porque, por um lado, “não são definíveis em termos de relações pulsionais de objeto, baseadas em relações representacionais de objeto (percepção, fantasia, simbolização)” (LOPARIC, 1996, p. 41-47) e, por outro lado, “porque estamos nos referindo a um momento pré-verbal, pré-psíquico e pré-representacional, anterior ao início de qualquer capacidade relacionada a mecanismos mentais e muito anterior ao reconhecimento de impulsos instintuais como fazendo parte do si-mesmo e tendo um significado” (DIAS, 1998, p. 258). As angústias impensáveis são traumas localizados nos estágios iniciais do amadurecimento humano, entendendo-se trauma, neste início, como quebra da continuidade na existência de um indivíduo. “Quando o padrão do ambiente é traumático”, esclarece Dias, “ocorre uma interrupção do amadurecimento. As angústias impensáveis quebram a incipiente integração, isto é, a incipiente experiência de um si-mesmo, de qualquer grau ou tipo, mas anterior à constituição de um eu, que existe por ocasião do fracasso ambiental” (DIAS, 1998, p. 255)
Ainda segundo o autor, deve-se observar que essas intrusões ambientais, que podem levar o bebê a um reagir excessivo, não produzem frustração, mas sim uma ameaça de aniquilação. Não produzem frustração, pois esse é um sentimento bastante sofisticado, que supõe a existência de alguém que já é capaz de desejar e frustrar-se em seu desejo. E nesse estágio inicial ao qual se refere à angústia impensável, o si-mesmo, o eu da pessoa, ainda está em formação, momento em que qualquer excesso a um ter que reagir é fatal para o continuar a ser, bem como para constituição de um sentido de ser. Isso afeta o si-mesmo verdadeiro ou o si-mesmo central do bebê.
De acordo com REGO, Ricardo (2014), Winnicott dá muita importância ao que ele chamou de “gesto espontâneo”, constituído pelas ações ou movimentos que surgem espontaneamente no bebê e que constituem uma expressão dele em direção ao mundo. Quando o ambiente (mãe) é capaz de acolher e complementar esse gesto, não há uma ruptura na continuidade do ser, e o bebê vai se desenvolvendo de maneira integrada. Este é o processo que leva à construção de um self verdadeiro.
Segundo CINTRA, Glória (2014), para Winnicott, o que traumatiza é a repetição da falha materna, tanto da mãe-pessoa quanto da mãe-ambiente. O excesso de interferência gera ruptura nos estados tranquilos do bebê, provocando respostas de submissão ou reatividade ao ambiente e acarretando no indivíduo a formação de um falso self.
Suas expressões deixam de ser ensaios de autonomia, e cada vez mais a vida interior se dissocia daquilo que se manifesta na vida familiar e social. No extremo patológico, o falso self acompanha-se de uma sensação de vazio, futilidade e irrealidade. (REGO, Ricardo, 2014).
Quando olhamos para essas repetidas falhas na relação mãe-bebê, que geram perturbações no desenvolvimento do indivíduo, conseguimos relacioná-las a alguns dos sintomas do pânico, como a sensação de irrealidade, despersonalização, medo de morrer, parestesias, medo de perder o controle dos seus atos, etc. Dado isso, conseguimos aproximar a teoria winnicottiana ao transtorno do pânico, onde a vertente inicial se daria na fase de dependência absoluta.

3. Biodinâmica

De acordo com CINTRA, Glória (2011), a Psicologia Biodinâmica propõe-se a ser uma visão de mundo em que corpo e mente são elementos de um mesmo organismo, na qual o ser humano é visto como vivendo em função de dois movimentos: a homeostase, ou seja, a busca do equilíbrio e da auto-regulação; e a evolução pela mudança e pelo movimento. Tem como princípio o respeito à singularidade de cada ser humano, buscando incentivar sua criatividade, potência e espontaneidade de forma afetiva, tolerante e não-invasiva. Enfatiza o amor, o prazer, o conhecimento, o trabalho e a espiritualidade como fundamentos de uma existência plena. Dentro da Psicologia Biodinâmica, uma das principais ferramentas é o uso da massagem, com grande variedade de técnicas como: Massagem Colônica, Orgonômica, hipotônica, Sintomática, Lifting, de Contorno, de Distribuição, Escoamento e outras. Essas técnicas têm como objetivo restabelecer a pulsação natural do organismo, os ritmos orgânicos, favorecendo a circulação da energia libidinal e o reequilíbrio do sistema nervoso autônomo simpático e parassimpático. Dissolve o reflexo de sobressalto, diminui os estados de stress e vitaliza os estados depressivos dos pacientes.
Segundo BOYESEN, Gerda (1986), sobre “A massagem que funciona como psicanálise”, …que seja possível influenciar pela massagem o inconsciente e as emoções recalcadas me foi uma grande revelação. Que o organismo seja capaz de recalcar as emoções e conflitos por tensões musculares e por uma contração crônica do diafragma foi uma outra revelação, essencial… O corpo encapsula as emoções, deixando músculos tão rígidos que a contração subsiste de maneira crônica. A energia se torna estática, encapsulada pelos músculos que chamamos de “repressores”. Assim nenhuma energia física é necessária para manter o recalcamento corporal, o que é uma maneira fantástica de neutralizar os conflitos. A energia emocional é escondida nas profundezas.
“Cada pequena tensão do corpo era tocada e tratada. “Seduziamos” cada resistência: a corporal, depois a psicológica.”
CAPÍTULO 2
USO DO TOQUE COMO RESGATE DO VÍNCULO AFETIVO

Segundo REGO, Ricardo (2014), conforme o enfoque winnicottiano, algumas massagens específicas são especialmente indicadas para lidar com a temática das vicissitudes do amadurecimento. Dentre elas, recomendo a massagem de contorno, a Shantala para adultos, as polarizações em geral. Dependendo do contexto, outros tipos podem ser utilizados, de acordo com as especificidades da pessoa e do momento clínico. A intenção é um elemento fundamental, devendo ser apropriada às necessidades do caso. O prazer e a confiança são parâmetros básicos nesse tipo de trabalho, ajudando a assegurar o êxito quando são alcançados pelo paciente. Alguns analistas biodinâmicos, ao se referir à forma de intervenção buscada nesses casos, falam metaforicamente numa !massagem parque de diversões”, enfatizando a dimensão do lúdico como algo que facilita a abertura para um contato emocionalmente significativo.
Segundo CINTRA, Glória (2014), a Psicologia Biodinâmica, com suas técnicas corporais, vem contribuindo para a reparação de falhas na constituição do sujeito e para retomada do desenvolvimento emocional do paciente em processo de análise; além disso, propicia maior integração psicossomática, alivia sintomas e promove elaboração imaginativa das funções corpóreas para que o verdadeiro self do indivíduo possa florescer.
Ainda segundo a autora, a Massagem Biodinâmica pode ser vista como um processo que busca a reparação das falhas no manejo materno; já o setting é um lugar seguro e confiável, no qual o paciente pode reviver traumas antigos e diminuir reações defensivas que perturbam o seu viver. Assim, poderá retomar o desenvolvimento emocional, experimentar maior integração psicossomática e o bem-estar de ser ele mesmo, resgatando sua espontaneidade e usufruindo de seu potencial criativo e de sua realização no mundo. É instrumento terapêutico importante, que permite ao paciente experimentar diversas sensações: ser ninado, embalado, protegido, nutrido, contido, acolhido e vinculado, permitindo o descongelamento do trauma, a retomada do processo maturacional, o fortalecimenTo do ego, o desenvolvimento da identidade, a autonomia, a autoafirmação e a autorrealização.
Um paciente que sofre de Síndrome do Pânico, por exemplo, desenvolve graves fobias em consequência dessa desorganização do Sistema Vegetativo; quando seu coração bate de forma descompassada, pode interpretar esse sintoma como a chegada de um ataque fulminante, e, portanto, da morte. Para ele, o ambiente interno do corpo torna-se pouco confiável e ameaçador (o que pode ser entendido como falta de holding ambiental). Vive em estado de estresse e constante sobressalto. O terapeuta biodinâmico, por meio do trabalho verbal e uso da massagem, ajuda no restabelecimento do equilíbrio dessas funções corporais (o que pode ser entendido como manejo suficientemente bom), permitindo que essa pessoa, esse psiquismo, habite em um soma hArmonioso, estável e confiável, que é a base para se exprimentar o bem-estar independente, o prazer de ser quem se é.
No processo de Massagem Biodinâmica, com esse enfoque winnicottiano, as emoções são acolhidas, não interpretadas. Ele visa harmonizar, restabelecer, restaurar as forças vitais, a circulação libidinal, o fortalecimento do ego-motor corporal (ver Boyesen, 1986), para que a personalidade primária – self verdadeiro – possa manifestar-se e se expressar com maior plenitude no mundo. Assim, a Massagem Biodinâmica propõe-se a ser uma interação criativa, um diálogo, uma comunicaÇão que vai além do verbal, buscando um lugar de ressonância e de contato entre o self do terapeuta e o self do paciente.

DESCRIÇÃO DE CASO
Paciente com diagnostico de pânico no qual usei meus conhecimentos em psicologia, massagem biodinâmica e a teoria de D. W. Winnicott.
Nome: Mara (fictício)
Sexo: Feminino
Idade: em torno de 35 anos
Profissão:
Fisioterapeuta com especialização em pneumo – quando iniciei o atendimento atuava como fisioterapeuta em um hospital da Zona Leste de São Paulo, atendendo pacientes internados (inclusive UTI). Há um ano e meio deixou o hospital e abriu um Studio de Pilates.
Queixa e duração:
Mara sofre com crises de pânico, dificuldade de engravidar e medo da morte. As crises já foram tratadas há alguns anos, porém ainda retornam de vez em quando. Por ser sua vizinha, um dia ela veio pedir ajuda pois estava passando mal. Ela estava pálida, achando que teria um AVC, porém se mostrava bem consciente que estava tendo uma crise de panico (ela sabia como começava, por onde começava e o tempo que durava). Conversando com ela, propus que ela fosse comigo até a maca e ela aceitou. Fiz polarizações, com intenção de fazer ela retomar contato com o corpo, para acalmar a respiração e voltar a fazer a energia circular através de toques presentes alternados com toques no campo sutil.
Fatores de piora/melhora:
Conviver em um hospital lhe dá medo de que tudo termine em morte. Sua experiência no dia a dia a leva crer que qualquer problema de saúde pode se agravar a ponto de não haver outra solução senão a morte. Sua avó faleceu próximo a virada do ano (2012 p/ 2013) e esteve internada no mesmo hospital em que trabalha meses antes de falecer.
Ela fica bem quando está entre amigos, família. É bem comunicativa e expansiva.
O que busca no tratamento:
Busca o equilíbrio corporal, pois já é atendida em psicologia por uma especialista.
Como fisioterapeuta, ela teve algumas experiências que a fizeram ter curiosidade sobre a relação corpo/mente. Uma vez comentou que ao atender uma paciente que passava por uma reabilitação de coluna ela começou a ter náuseas, e de repente a paciente também teve os mesmos sintomas, porém a paciente começou a vomitar de fato.
Há relatos também no hospital sobre a melhor recuperação dos pacientes quando o mesmo tinha um familiar próximo, quando era bem atendido, entre outros fatores, porém ela assimilava sempre que muitas das dores dos pacientes era sentida por falta de atenção, contato, então logo passou a perceber que grande parte dos seus sintomas eram relativos a algum tipo de somatização.
Dados biográficos de interesse:
Nascida em São Paulo, Gêmea. Foi a segunda a nascer e tem menos tônus que sua irmã. Possui muitos amigos e é casada há 10 anos. Desde que se formou em fisioterapia atua no hospital e em atendimentos particulares.
Família:
São em quatro filhos. Mara é a terceira filha, sendo a segunda no parto das gêmeas.
A avó materna foi uma figura muito importante. Ela cita que ela foi criada mais pela avó e a mesma sempre foi mais “encanada” que a mãe (que criou a irmã gêmea). Pai tem Parkinson.
Tratamentos: doenças importantes atuais e passadas; tratamentos realizados: intervenções corporais (RPG, eutonia, rolfing etc.), uso de drogas, internações, psicoterapias, medicamentos, cirurgias.
Quando iniciei o atencimento, era atendida por uma psicóloga, e estava tomando Frontal, receitado por um psiquiatra. Esteve afastada do trabalho por 10 dias, após o falecimento da avó.
Em set/12, fez uma tentativa de inseminação artificial, porém sem sucesso. Após vários exames sem diagnóstico preciso do motivo pelo qual não engravidava, sua médica optou e sugeriu que ela fizesse uma cirurgia pois a hipótese diagnóstica era de endometriose no ovário. A cirurgia foi feita em meados de nov/dez/12. Mesmo apesar da cirurgia, não foi detectada a endometriose.
Após a cirurgia, ela tentou por meios normais, engravidar.
Minhas observações:
Paciente ativa, falante, energia concentrada na cabeça, concentra tensão na cabeça e pescoço. Magra, porém mais fina nas pernas e pés. Chorava por qualquer motivo.
Não tinha grounding, energia fria no ventre. Sensação que só tinha cabeça. Demais membros alongados, porém baixa estatura.
ACOMPANHAMENTO DOS TRATAMENTOS REALIZADOS
Sessão no. 01 Data: 06/02/13
Terapeuta
A) Tive dúvidas a respeito da manobra a ser utilizada pois não estava preparada para que ela tivesse uma crise de pânico.
B) Iniciei a sessão com polarizações. Ao longo da sessão percebi a energia concentrada na cabeça, pescoço, garganta, logo não quis mobilizar essas regiões, pois senti que estavam bem afloradas. Senti também que ela não estava relaxando.
C) Como a peristalse não abriu, intui que ela precisava de grounding e comecei com distribuição de energia, contornos corporais e calatonia. A estratégia foi não mobilizá-la mas dar a ela noção que ela poderia distribuir suas sensações pelo corpo, fazendo-a sentir seu corpo como um todo e não concentrado apenas na parte superior. E principalmente trazer a confiança dela.
D) Creio que pelo fato dela ter dormido, e conseguido ficar em silêncio, ela confiou no que estava sendo feito e pode começar a relaxar.
E) A paciente saiu mais calma, sonolenta, com vontade de ficar mais quietinha.
Paciente
A) Ao longo da sessão, ela mesma percebeu que pode confiar por já me conhecer. Não teve visões, nem memórias ou sonhos.
B) Enviei uma mensagem para a paciente dois dias após o atendimento para saber se ela havia ficado bem. Me surpreendi pois ela disse que no momento em que enviei a mensagem ela estava pensando em me ligar. Ela relatou que no dia seguinte de manhã, foi atendida por sua psicóloga e a mesma a achou agitada (muitos pensamentos, sem conclusão de um assunto já entrava em outro). Dois dias após, ela relatou ter ido ao banheiro pela manhã normalmente. A tarde foi acometida de dor de barriga, foi ao banheiro e a noite teve diarréia. Porém disse que dormiu bem (paciente tem tomado frontal pois tem tido insônia).
Sessão no. 02 Data: 08/02/13
Conversamos a respeito do atendimento feito na primeira sessão. Ela relatou a diarréia, a preferência por ficar mais quietinha, dormiu melhor. Disse que sonhou, mas não se lembra do conteúdo.
Expliquei a ela o que fiz no atendimento, me coloquei a disposição para o que ela precisasse.
Sessão no. 03 a 04 Data: 13/02/13 e 14/02/13
Segui com as polarizações, distribuição de energia com a intenção de obter grounding. Seus pés e suas mãos eram sempre gelados. Olhar agitado mesmo com os olhos fechados. Iniciei movimentação passiva pouco ampla nos braços para distribuir a tensão do pescoço.
A paciente relata que desde a primeira sessão já não sentia mais o peso nos ombros, está dormindo melhor e já estava sem tomar o Frontal para dormir, havia três dias. Diminuição do choro, e sem crises de pânico.

Sessão no. 05 e 06 Data: 20/02/13 e 23/02/13
Paciente relatou que se estava se sentindo muito bem e disposta. Porém houve um episódio no trabalho que gerou um desconforto entre ela e uma outra profissional. Mara comentou um interesse de mudar de período no hospital e a outra profissional sentiu-se traída. Ela disse que geralmente se mantem quieta, mas que dessa vez falou o que tinha para falar. Após isso, ficou perturbada e toda hora o assunto retornava na sua cabeça. Com isso, voltou a tomar o Frontal para dormir.
Utilizei espirais nos olhos e ouvidos na intenção de esvaziar a cabeça. Após as espirais fiz polarizações, pouca movimentação passiva nos braços (pouca amplitude) para distribuir a tensão e também fazer ela sentir leveza. Massageei um pouco a cabeça e distribuição de energia para grounding. A persitalse se manteve aberta durante toda a sessão. Barulhos secos como pedras rolando alternavam com rangidos.
Na sessão seguinte, relatou que ficou bem, estava dormindo bem, se sentindo mais calma e com a cabeça mais tranquila. Ela expressou que a massagem tem dado um resultado muito positivo e está bem feliz.

Sessão no. 07 Data: 27/02/13
Mara contou que se desestabilizou na segunda-feira anterior a essa sessão por conta de uma intercorrência no Pronto Socorro do hospital, onde a paciente “jorrava” sangue pela boca. A paciente rejeitou maca, cadeira de rodas e foi andando pelos corredores do hospital pedindo socorro. No hospital a suspeita era tuberculose, porém Mara achava quer era hepatite. Ela estava paramentada, e na tentativa dos médicos entubarem, o cano perfurou a traquéia e saiu na clavícula esquerda. Mara chegou contando que essa imagem não saia de sua cabeça. Manteve o Frontal.
Novamente fiz espirais nos ouvidos e olhos para esvaziar essa imagem e acalmá-la. A paciente veio a falecer. Fiz polarizações, distribuição de energia e calatonia na tentativa de refazer a circulação energética e trazer grounding para evitar o fortalecimento da idéia de morte que ela possui.
Minha sensação era que eu precisava acolher o seu medo. Vinha como uma criança muito asssustada.
Sessão no. 08 Data: 06/03/13
Relatou tonturas no sábado anterior e um pouco de náusea. Durante a massagem, senti náuseas também ao fazer massagem nos seus pés e nos pontos de fígado e vesícula.
A energia estava um pouco pesada, embora ela parecesse estar sem energia. Tive a sensação de que seu fígado estava intoxicado.
Fiz basicamente polarizações. Foquei também nos ovários e útero.
No dia seguinte a essa sessão a tarde ela relatou que teve dor de cabeça e me perguntou se poderia ser o fígado. Eu a questionei se a dor ocorreu após a massagem ou após a sessão com a sua psicóloga (que ocorreu pela manhã). Ela respondeu que foi após a consulta com a sua terapeuta. Perguntei que tipo de material elas trabalharam e se ela achava que fazia sentido que algum dos assuntos pudesse ter a ver com esse sintoma. Ela relatou que falaram sobre sua avó e sobre a cirurgia de Parkinson do seu pai que estava agendada para dali um mês. Ela concordou que sim.
Minha sensação é que as sessões estavam correndo bem, porém ela oscilava muito e logo voltava para o seu padrão mental.
Comentou que não teve mais crises completas de pânico. Antes as crises duravam em média trinta ou quartenta minutos. Ela suava, tinha taquicardia, formigamento. Porém após o início das massagens parece que as crises estão “em pedaços”. Hoje, ela tem um sintoma por vez e ue não dura mais como antes.

Sessão no. 09 Data: 13/03/13
Iniciei essa sessão com uma intuição de fortalecer o mental para que ela tivesse sustentação para a cirurgia do seu pai.
Relatou que está com o apetite muito aberto. Geralmente quando fica tensa, perde o apetite, e com isso, ela disse: “estou me sentindo como nunca me senti antes”. Parou o Frontal, e tem procurado não pensar só nas coisas ruins, dizendo que elas passam pela cabeça mas não ficam. Senti a região do fígado pesado, e ela comentou que tem acordado com um gosto ruim na boca. Senti enjoo novamente quando massageei seus pés e pernas. Massageei bastante a cabeça e pontos de fígado nas pernas e pés. Peristalse bem abert desde o início, com barulhos como pedras rolando, ranger de portas, principalmente quando o toque era na cabeça, e na regiao de útero e ovários. A minha estratégia era levantar um pouco de conteúdo, tentando dissolver um pouco a couraça. Tive dúvida se houve deslocamento do sintoma com esse novo sintoma de apetite aberto.

Sessão no. 10 Data: 20/03/13
Mara diz que percebeu muita melhora desde que iniciou com a massagem. A melhora ela quer dizer, que é se sentir bem, porém também tomar maior consciência das suas tensões no corpo.
Relatou que está mais tensa, o pescoço está duro, porém está consciente que é por conta da preocupação com a cirurgia do seu pai que acontecerá dali a quinze dias.
Fiz polarizações, trabalhei com massagem na cabeça e no rosto e calatonia nos pés. A intenção foi harmonizar e trazer o mesmo tempo contenção para dar sustentação para não entrar num colapso.
Comentou que percebeu qua a cabeça e o maxilar estavam doloridos (“nossa, só agora percebi como a minha cabeça e meu maxilar estão sentindo a tensão”).
Disse da felicidade porque seu esposo havia fechado um pacote de viagem para a Europa para comemoração de dez anos de casamento.
A expectativa sobre a gravidez está mais tranquila.

Sessão no. 11 Data: 30/03/13
Mara chegou com gripe, acredito eu que muito em virtude de uma baixa resistência por conta da ansiedade da cirurgia de Parkinson de seu pai dali a quatro dias. Utilizei técnicas para promover seu relaxamento, sempre focando nas polarizações e distribuição de energia.
Saiu sentindo-se muito melhor.
Peristalse com barulhos como gritos sufocados.

Sessão no. 13 Data: 08/04/13
Chegou bem, contando que os arrepios cessaram. Sua peristalse não estava muito aberta. Estava sentindo-se bem. Mantive a conduta de polarizações e distribuição de energia. Aos poucos eu sentia o descongelamento e uma circulação melhor da energia.
Comentou que tem dormido bem e não teve mais crises de pânico. Está trabalhando na UTI e tem lidado melhor com as circunstâncias do trabalho. Relatou que presenciou o falecimento de um senhor e sua esposa estava ao lado. Mara fala que a frequência cardíaca foi baixando até parar. Disse que se emocionou mas não se abalou. Sensação que estava se fortalecendo aos poucos.

Sessão no. 14 Data: 13/04/13
Iniciamos a sessão, ela relatou estar bem, que não tomava mais Frontal para dormir, e que agora estava difícil até para acordar.
Iniciei a massagempela cabeça, porém senti uma repulsa. Dado isso, parti para o corpo. Trabalhei primeiro o lado direito, depois o esquerdo e integrei no final.
Ao final, relatou que no início da massagem surgiram vários pensamentos na sua cabeça. Preocupações, tarefas, compromissos. Comparou ao que sentia antes de dormir quando tinha insônia. Pedi que observasse e qualquer coisa me procurasse.
Relatou também que na polarização do ventre, teve bastante vontade de urinar.
Sessão no. 15 a 20 Data: 22/04/13 a 10/06/13
Durante essas sessões, os relatos de oscilação de choro e raiva retornaram. A vontade de ficar “para dentro” e o cansaço também voltaram, apesar de chegar sempre falante nas sessões.
Seus pontos de preocupação que geravam a ansiedade e a raiva, permeavam a questão da cirurgia do seu pai, o problema de pressão alta e depressão de sua mãe, uma possível perda de emprego do esposo (vê nele seu porto seguro) , a dificuldade de engravidar (sua menstruação atrasou e chegou a fazer um teste de gravidez que deu negativo). Como ela disse: “Estou me sentindo por último”.
Entre as sessões, a peristalse se alternava entre aberta e fechada. E quando aberta, os barulhos também se alternavam, entre ruidos secos, rangidos e borbulhas.
Mantive as polarizações, distribuição de energia, calatonia. Seus pés estavam gelados, energia na cabeça.
Na sessão dezoito, senti uma rigidez no estômago e ela relatou arrepio quando fiz o toque.
Embora se sentindo “por último”, não teve crises de pânico e nem voltou a tomar remédio.
Pensei em trabalhar a respiração, mas desisti da idéia, pois poderia ser um fator que talvez ela ainda não estivesse pronta para lidar e achei que pudesse desintegrá-la.

Sessão no. 21 a 28 Data: 17/06/13 a 12/08/13
O relato dessas sessões, inclusive com solicitação de atendimento extra permeou uma agitação. A fala era: “Estou com a cabeça a mil”.
Chegava falando sobre diversos assuntos: família, trabalho, do cansaço, da perda de emprego do esposo, da dupla jornada entre o hospital e o Pilates, etc. Em algumas sessões não silenciou e fui fazendo os toques e permitindo que ela continuasse interagindo (ela tentava fechar os olhos, dizendo que ia ficar quietinha, mas na sequencia já emendava outro assunto). Nessas sessões, procurei trazer grounding, sem bloquear a fala.
Em algumas ela dormia profundamente.
Peristalse oscilando, mas na maioria das vezes aberta.
Na sessão vinte e quatro, senti como se seus membros estivessem colados. Principalmente braços. Ao final ela relatou a mesma sensação. Saiu sentindo-se um pouco espalhada. No dia seguinte enviou uma mensagem dizendo que estava bem.
Na sessão seguinte, associou os braços colados a mesma posição que a paciente em estado vegetativo que ela atende fica, e na sequência emendou que as pessoas falam de filhos, e que ela soube que o esposo dessa paciente em estado vegetativo conta aos filhos que a mãe esta morta. Para mim ficou um pouco da sensação de uma impotência muito grande.
Nas sessões seguintes, quis iniciar a massagem pelos joelhos e tornozelos, como se fossem a sustentação, a potência que ela precisa. Sua peristalse abriu completamente, sendo possível escutar sem o esteto. Saiu sentindo-se muito bem.
Apresentou dor nas pernas, estava falante, senti muita vibração no quadril do lado direito e ombro esquerdo. Tive a sensação de uma raiva reprimida. Ela comentou que levou uma lição de moral de sua sogra e minha sensação é que ela queria dar um chute.
Passou bem os dias seguintes. Recebeu os familiares em casa para o dia dos pais. Pedi que observasse.

Supervisão
Entre essas sessões, fiz uma supervisão do caso, e foram levantados alguns pontos que poderiam ser levados em conta.
– Pânico tem a ver com desamparo
– A depressão e a hipocondria tem algo de raiva
– Trabalhar a agressividade e o apoio para estar mais tranquila a mudar de emprego
– Nunca fazer toques rápidos, ansiosos
– Perfil mais imaturo
– Pânico + hipocondria + imaturidade = não tem grounding nem contorno
– Estar em grounding = acompanhar o processo com calma
– Ver se é possível trabalhar a vibração das pernas, a abertura da respiração e distribuir
– O pouco é muito!

Sessão no. 29 Data: 19/08/13
Mara chegou relatando que ficou muito mal da sessão anterior para esta. Disse que teve náuseas, tontura, ficou chorona. Teve duas crises de pânico e ficou muito assustada pois nunca tinha tido duas crises na mesma semana. Sentia os membros pesados. Era nítida a desvitalização.
Estava chorosa, com medo, e ao deitar-se na maca comentou que estava com a ponta do nariz formigando.
Fui trabalhando contorno, polarizações. Novamente senti que sua energia tinha subido toda para a cabeça. Peristalse bem aberta, principalmente ao tocar a base do pescoço.
A dormência do nariz passou, apesar de cansada, saiu sentindo-se melhor.
No dia seguinte, enviou uma mensagem dizendo que estava melhor.
Procurei ficar presente, em grounding, porém mexeu com meu processo de impotência, medo e fiquei me sentindo mal também. Levei para a minha terapia.

Sessão no. 30 Data: 29/08/13
Relatou melhora durante a semana. O choro e as crises de pânico não reapareceram.
Relatou nova dor: lombar.
Fiz uma distribuição pausada conforme orientação na supervisão e também fiz massagem com intenção de desbloquear essa energia contida na lombar. O local estava bem quente.

Sessão no. 31 Data: 02/09/13
Mara está se sentindo bem, mas acha que está oscilando muito. Hora choro, hora se sente bem, hora apática, hora normal.
Esteve bem durante a semana. A dor lombar teve pequena melhora, mas comentou que seu pescoço estava travando (lado esquerdo). Ela associou rapidamente ao encontro com familiares pelo aniversário de seu marido.
Trabalhei com polarizações, deslizamentos. Ela trouxe a questão da maternidade a tona.
Fiz alguns questionamentos a respeito… desde quado ela queriaser mãe, e desde quando ela trazia a sensação de que não daria conta.
Começou a relatar que há cinco anos fixou a idéia de ser mãe. Antes ela tinha medo e nem pensava em ter filhos, por conta dessa sensação de não dar conta. Procurei saber mais, se ela tinha alguma lembrança que trazia essa sensação de não dar conta. Ela comentou que não se lembra muito da infância, mas lembra-se de um episódio de quando tinha nove anos e viajou com a família para a praia. Sua mãe estava grávida de sete meses da sua irmã caçula. Na casa havia muitas baratas e ela teve muito medo. Dormiu entre seus pais de olhos abertos. Teve febre e vômito de tanto medo que sentiu.
Após a massagem comentou que está muito abalada porque seu pai foi dirigindo com sua mãe para a cidade de Aparecida para pagar uma promessa.
Emendou que seu pai só olha para o própiro umbigo e que sua irmã gêmea é assim também, e que sua avó materna também era. Disse que ela se parece mais com a mãe. Saiu sentindo-se bem.

Sessão no. 32 e 33 Data: 16/09/13 e 23/09/13
Relatou que as crises estão controladas, porém a dor lombar está se estendendo para o pescoço. O quadril estala bastante. Sugeri que fizesse um raio-x, até porque tev um episódio onde segurou subitamente um paciente, e pode ter causado algum problema.
Fiz deslizamentos, polarizações. Respiração bem presa. Mostrei como fazer o exercício da respiração. Teve muitas descargas vegetativas, peristalse bem aberta.
Na sessão trinta e três, relatou que seu intestino estava solto. A dor lombar havia melhorado. Atendimento rápido pois atrasou-se.

Sessão no. 34 Data: 15/10/13
Mara chegou muito bem. Muito feliz, relatou que estava grávida de mais ou menos seis semanas.
Senti um receio de fazer a massagem, como se agora não fosse necessária a massagem, e também pelo receio de não saber exatamente o que se poderia ou não utilizar.
Fiquei meio sem saber o que fazer.
Fiz quinze minutos de polarizações e deslizamentos com intenção de dar boas vindas ao bebê.

Supervisão
Fiz uma supervisão durante a aula para entender melhor como trabalhar com a massagem em grávidas
– Evitar toques na barriga
– Dizer que não tem contra-indicação
– O trabalho será feito respeitando a vontade de prazo, tempo da sessão
– Na gravidez a mulher tende a ficar mais introspectiva e a massagem pode ser invasiva
– Poderia utilizar nela a massagem da borboleta

Sessão no. 35 Data: 22/11/13
Mara me procurou durante a semana dizendo que tinha interesse em fazer a massagem para relaxar.
Nesta sessão conversei com ela a respeito de como ela vem se sentindo, pedi para falar sobre os ganhos/perdas que a massagem trouxe a ela desde o início e ela comentou que sentiu melhora na ansiedade, no turbilhão da cabeça. Tem se sentindo muito melhor. A forma como ela lidou com fatos importantes. Da internação da avó até a cirurgia do pai, o desemprego do esposo. Ela lembrou como se posiciou em cada momento.
Pontuei que ela poderia fazer a massagem respeitando sua vontade deprazo, tempo de sessão, etc.
Mara topou. Fizemos trinta minutos de massagem. Deslizamentos, polarizações.
Não usei esteto.
Aqui acredito que a massagem auxiliou no processo de grounding para que ela pudesse aceitar bem a gravidez.
Sessão no. 36 Data: 13/12/13
Mara está sentindo-se bem, está em férias no hospital, porém correndo com os atendimentos em Pilates.
Sua gravidez está entre três e quatro meses e soube que é um menino.
Fiz polarizações, ouvi um pouco com o esteto. Peristalse aberta com barulhos oscilando.
Saiu sentindo-se bem.
Sessão no. 37 a 42 Data: 18/12/13 a 05/03/14
Entre o quarto e o sexo mês, durante as sessões, Mara começou a somatizar alguns problemas. Teve muitas dores de cabeça, pressão nas temporas, apresentou bolinhas vermelhas nas pernas (nesse episódio, disse que buscou de todo jeito falar com alguém para que dissessem que estava tudo bem, mas sem sucesso) e buscou um médico que comentou que poderia ser circulação. Soube que estava bebendo pouca água e que estava com pouco líquido na bolsa. Citou que apesar de tudo não teve crise de pânico.
Em uma das sessões, relatou que sentia seu corpo tão pesado, que parecia que tinha marcado a maca.
O seu ritmo de trabalho está bem pesado.
Mantenho as polarizações, os deslizamentos, a calatonia e massagem com óleo nos braços e mãos. As vezes dorme profundamente durante a sessão.
Minha intenção é tentar acalmá-la e ajudá-la a acreditar que dará conta de ser mãe.

Sessão no. 43 a 48 Data: 26/03/14 a 21/05/14
Nesse período entre o sétimo e o nono mês de gestação, por conta da barriga, a posição para massagem para dormir já fica um pouco mais dificil. Sugeri que passassemos a fazer deitada de lado. A dor nas costas, pescoço já incomodam mais.
Sua aflição está por conta do nível baixo de água na bolsa e por estar com um pouco de contração.
Neste período comecei a fazer as massagens na casa dela, pois também não podia mais dirigir.
Em algumas das sessões ouvi sua peristalse sem auxílio do esteto. Se manteve bem aberta.
Mantive a calatonia, polarizações, deslizamentos, massagem nas mãos e pés com óleo.
Mara conseguia relaxar durante a massagem, mesmo as vezes se mantendo acordada.
A sentia mais viva, mais segura, e mais pronta para ter o seu bebê.

Sessão no. 49 e 50 Data: 05/06/14 a 14/06/14
Dia 31/05/14, Mara deu a luz a um bebê com 3,335kgs e 48 cm.
Retornou do parto com uma contratura cervical no lado esquerdo do pescoço.
Nestas duas sessões trabalhei o pescoço e na última fiz calatonia.
Ela relata que tremeu muito durante o parto, e tinha a sensação que ainda sentia esse frio da hora do parto. Procurei trabalhar o acolhimento, o aquecimento para ela liberar essa tensão que se alojou no pescoço.
Peristalse abriu, muitas descargas vegetativas. Ficou bem e a dor no pescoço passou.
Dificuldade de amamentar.

Sessão no. 51 a 69 Data: 02/07/14 a 21/01/15
Mara tem estado muito cansada. Dificuldade de amamentar, Jonas com cólica e refluxo.
Senti que não havia se apropriado das funções de mãe. Percebia outras pessoas cuidando dele, e ela não havia se vinculado, criado uma rotina entre os dois. Insegurança de deixá-lo dormir no berço.
Relatou que não teve mais crises de pânico, porém, a preocupação dela hoje é que algo aconteça com o filho.
Relata dores nas costas e pescoço por conta da postura na amamentação e para carregar o filho. As vezes tinha dores de cabeça.
Pediu demissão do hospital e passou a dedicar-se apenas ao Pilates.
Na maioria das sessões sua peristalse esteve aberta com barulhos secos alternados com barulhos de uma corredeira, sendo possível, na maioria das vezes ouvir sem esteto.
Relatou dor no joelho, mas dizia que não era muscular. Pedi que ela pudesse pensar qual associação ela poderia fazer, e ela relatou um medo do futuro e chorou.
Trabalhei com polarizações e calatonia. Fiz um trabalho para acordar a musculatura nas últimas sessões. Minha intenção era ela se sentir viva, inteira e trazer presença de partes do corpo que ela não se dá conta que existe.
Relatou melhora de noventa por cento nas dores de cabeça.
Parou de amamentar pois seu filho apresentou alergia a lactose.
Manteve-se agitada, porém criou uma rotina com seu filho, conseguiu colocá-lo no berço para dormir. Hoje tem mais tônus nos membros inferiores e braços.
Todo o trabalho de massagem biodinâmica foi muito importante para o grounding da Mara e preparação para essa maternidade. Talvez não só a energia do seu ventre estava estéril, mas todo o seu corpo também estava, por isso a dificuldade de engravidar.
Esse primeiro trabalho mexeu com a minha insegurança, com a minha sensação de impotência e também desenvolveu minha paciência. O medo de errar, e o cuidado de evitar excesso de narcisismo quando os resultados eram positivos, me trouxe muito aprendizado e uma bagagem enorme que também tive oportunidade de trabalhar na minha terapia.
As supervisões foram de grande valia, pois pontuaram momentos importantes e foi onde pude perceber que a minha percepção não era muito diferente, e isso me aliviava, ao mesmo tempo que trazia preciosidades para o trabalho de ajudá-la aos poucos a ter pernas, a se sentir viva, a ponto de conseguir nesses dois anos de trabalho ser mãe e desligar-se do emprego que reforçava tanto seu medo da morte.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após esses quatro anos de formação, ainda não consigo compreender como consegui viver alguns anos sem o conhecimento da Psicologia Biodinâmica. É algo tão vivo, pulsante e representativo que me permitiu entender que hoje eu posso ressignificar vivências, sem precisar eliminá-las de forma traumática da minha vida.
Ao estar vivendo o processo de psicoterapia biodinâmica, pude elaborar questões psíquicas, experiências traumáticas, incorporando-as em minha história e personalidade.
Ao invés de descartá-las como me foi proposto em entrevista com dois outros profissionais de psicologia que me disseram algo como: “imagine seus problemas como sacos que você carrega em suas costas (…) se ficam pesados demais você deve cortá-los e largar pelo caminho (…) logo, se sua família é um problema, você deve deixá-los também…”. Um choque para mim esse tipo de postura.
O atendimento a pacientes com Transtorno do Pânico, me permitiu experimentar um pouco das angústias impensáveis, da questão da instabilidade ambiental, e o quanto a relação materna na fase da dependência absoluta é de grande importância para o aparelho psíquico.
Viver o passado no presente, estarmos presentes, abrir-se para o futuro… sabendo que possibilidades existem para que não nos encarceremos com todo esse fluxo, podendo viver a dinâmica da vida.

BIBLIOGRAFIA
CINTRA, Maria da Glória Pimentel. O tratamento da síndrome do pânico através da psicoterapia corporal. In: ENCONTRO PARANAENSE, CONGRESSO BRASILEIRO, CONVENÇÃO BRASIL/LATINO-AMÉRICA, XIII, VIII, II, 2008. Anais. Curitiba: Centro Reichiano, 2008.

SANTOS, Eder Soares. Apontamentos sobre as angústias impensáveis em Winnicott. Rev. Filos., Aurora, Curitiba, v. 23, n. 33, p. 475-492, jul./dez. 2011

CAMARGO, Andréia. Traumas da infância e o transtorno do pânico. www.psicologia.pt, dez./12

DIB, Patrícia de Oliveira. Vínculos afetivos e Transtorno do Pânico: um estudo psicanalítico. Trabalho de Conclusão de Curso da Graduação em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob orientação da professora doutora Ana Maria Trapé Trinca, no ano de 2002. Ganhador do IX Prêmio Ana Maria Poppovic- 2003.

SILVA, Ana Beatriz Barbosa. Mentes Ansiosas: medo e ansiedade além dos limites. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011

STEINWURZ, Denise Aizemberg. Biografias: Donald Woods Winnicott. Federação Brasileira de Psicanálise. http://febrapsi.org.br/biografias/donald-woods-winnicott/

REGO, Ricardo “Guará” Amaral, PORTO, Dinorah Poletto, AMABIS, Dulce C., FORLANI, Maria, MARTINS, Sandra. O toque na psicoterapia: Massagem Biodinâmica. Rio de Janeiro: KBR, 2014

BOYESEN, Gerda. Entre psiquê e soma. São Paulo: Summus, 1986

REGO, Ricardo “Guará” Amaral. Deixa Vir…: Elementos clínicos de Psicologia Biodinâmica. São Paulo: Axis Mundi, 2014

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